Adeus a Ariano
Familiares de Ariano vestiram a camisa do Sport, time do coração do escritor, para homenageá-lo
Foto: Amanda Miranda/NE10
"E, se não há quem queira pagar, peço pelo menos uma recompensa que não custa nada e é sempre eficiente: seu aplauso / Pano / Recife, 24 de setembro de 1955." Encerra Ariano, provavelmente a sua obra mais famosa, O Auto da Compadecida, tantas vezes adaptada para o teatro e o cinema. No final da tarde desta quinta-feira (24, não de setembro, mas de julho), quase seis décadas depois, as cortinas fecham e o mestre Suassuna vai descansar - quem sabe com a sua Nossa Senhora? Mas a missão já foi cumprida. Deixou todos os personagens e duas lições principais: o amor pela cultura nordestina e a leveza. Foi sepultado no fim da tarde de ontem no cemitério Morada da Paz, em Paulista, no Grande Recife, porém teve a sua imortalidade destacada por familiares, amigos e outros admiradores. Recebeu aplausos.
A literatura, o principal legado de Ariano, foi destacado na cerimônia que durou meia hora. Poemas escritos por ele foram recitados pelos netos, começando por “Fazenda Acahuan” e “A mulher e o reino”, feitos, respectivamente, para o pai do dramaturgo, João Suassuna, assassinado quando ele ainda era criança, e para a mulher, Zélia de Andrade Lima. Enquanto o túmulo era fechado, o grande amor da vida de Ariano jogou um buquê de flores e olhou concentrada, visivelmente emocionada, amparada por duas netas.
Assim como foi visto durante todo o velório, realizado no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo de Pernambuco, o enterro do escritor Ariano Suassuna foi cheio de pernambucanidade. A chegada ao cemitério, às 16h50, foi ao som de “Madeira que cupim não rói" tocada por violinos. Em coro, os admiradores voltaram a cantar a música que virou marca do dramaturgo. A “Ave Maria” de Charles Gounod também foi cantada aos pés do caixão.
Eram 17h20 quando pétalas de rosas vermelhas e brancas começaram a ser jogadas no caixão. Ariano foi sepultado no jardim familiar ao lado de outro ícone pernambucano: o cantor Reginaldo Rossi, que faleceu no fim do ano passado. "Viva o Movimento Armorial!" foi um dos gritos dos fãs para as últimas homenagens.
VELÓRIO - As homenagens começaram ainda no fim da noite dessa quarta-feira (23), no Palácio do Campo das Princesas, com celebração católica e orações de admiradores do escritor. Vários fãs do escritor e autoridades políticas estiveram presentes no velório, que seguiu até as 15h50 desta quinta (24). A presidente Dilma Rousseff (PT); o atual govenador de Pernambuco, João Lyra (PSB); e o prefeito do Recife, Geraldo Julio (PSB) estiveram presente.
O ex-governador e presidenciável Eduardo Campos (PSB) acompanhou Ariano desde essa terça (22), ainda internado no Hospital Português. Eduardo tem ligação com o escritor desde criança e a sua esposa, Renata Campos, é sobrinha da mulher do dramaturgo. Emocionado após receber a notícia do falecimento dele, o socialista descreveu que Ariano é "exemplo de dignidade e amor ao Brasil" que todos os brasileiros deveriam seguir.
Símbolos que representavam Ariano foram levados para o Palácio no velório: o estandarte do Galo da Madrugada, que o homenageou este ano; um boneco gigante; as bandeiras do Sport Club do Recife, seu time do coração; do Brasil, de Pernambuco e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde trabalhou como professor por muitos anos. Diversos grupos de maracatus também foram dar o último adeus ao mestre da cultura popular.
Cortejo fúnebre e velório de Ariano Suassuna
Boneco gigante e estandarte do Galo da Madrugada 2014, que homenageou Ariano, ficaram perto do caixão.
Crédito: JC Imagem
Autoridades políticas como Dilma, estiveram presentes no velório
O corpo do escritor deixou a sede do governo ainda coberto com as bandeiras e, sobre ele, o buquê que dona Zélia iria segurar durante toda a cerimônia de sepultamento. O corpo foi levado por netos de Ariano, que, após entregá-lo aos Dragões dos Guararapes, se abraçaram e gritaram "Viva vovô!". Os familiares seguiram em cortejo pela Rua da Aurora, Avenida Agamenon Magalhães e rodovia PE-14. Por onde passou, moradores saíram às ruas para ver o carro do Corpo de Bombeiros que o levava - entre os que conheciam ou não, as palavras do "mestre" da literatura. Reconhecido por unir o popular ao erudito e falar em linguagem simples, Ariano é tido pelos parentes como um homem do povo.
LUTO - Ariano Suassuna morreu nessa quarta-feira no Recife, aos 87 anos, vítima de parada cardíaca após entrar em coma depois de sofrer um Acidente Vascular Cerebral (AVC) hemorrágico na noite da última segunda-feira (21). Pelo falecimento, a Prefeitura do Recife e o Governo do Estado declararam três dias de luto oficial.
Amiga de Ariano, a secretária de Cultura do Recife, Lêda Alves, contou, também após saber sobre a sua morte, que o escritor revelou que sabia que a 'Cateana', como chamava a morte, acabaria chegando a ele, embora tenha fugido dela por muitos anos. Se em todas as aulas-espetáculo dizia que não iria morrer, na última, na última sexta-feira (18), no Festival de Inverno de Garanhuns, no Agreste de Pernambuco, afirmou, segundo Leda: "Eu vou morrer, mas meus personagens vão ficar todos com vocês." Pois é, Ariano, como você mesmo disse também, o homem nasceu para a imortalidade.
Fonte: Ne10
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