Exposição traz núcleo contemporâneo, com 16 artistas, e núcleo histórico, com fotos do Mestre Vitalino tiradas por Pierre Verger

Publicação: 12/04/2014 07:05 Atualização: 11/04/2014 17:31


Um olhar multidisciplinar e complexo sobre o barro em uma cidade que tem o artesanato em argila como parte fundamental de sua identidade. A 1ª Bienal do Barro, que começa hoje, às 17h, em Caruaru, no Agreste do estado, tem como o mote a reflexão sobre o lugar da arte a partir do uso desse material, que faz parte de um tripé que define a cidade: o artesanato, o forró e a feira. A exposição ocupa dois locais da maior cidade do Agreste, com obras de artistas contemporâneos e uma revisão de uma das figuras mais emblemáticas da cidade, o Mestre Vitalino. A abertura também terá uma palestra com o idealizador da bienal, Carlos Mélo, e o curador da mostra, Raphael Fonseca, cujo tema são as perguntas O que é uma bienal? Por que uma bienal do barro?

Um dos dois espaços expositivos da bienal é a Fábrica Caroá, uma das edificações mais emblemáticas de Caruaru. O local abrigará o Núcleo Contemporâneo, com obras de artistas do Brasil inteiro. A história do próprio espaço expositivo e da apropriação do barro na cidade serviu como matéria-prima para as obras expostas, originadas de residências artísticas com durações variadas.

A exposição traz dezesseis artistas: Clarissa Campelo, Daniel Murgel, Deyson Gilbert, Ivan Grilo, Jared Domício, Jorge Soledar, José Rufino, Laerte Ramos, Leila Danziger, Luísa Nóbrega, Marcone Moreira, Nadam Guerra, Presciliana Nobre, Armando Queiroz, selecionado também para a Bienal de
 São Paulo, e dois representantes pernambucanos: José Paulo e Márcio Almeida. 

O curador Raphael Fonseca, do Rio de Janeiro, trouxe para a seleção das obras a curiosidade em saber como o barro e Caruaru se encontraram. “A cidade tem o artesanato como ícone, mas também tem uma vocação comercial e industrial. Qual é o passado e o presente do uso da cerâmica e como a ideia de ‘popular’ se articula com isso? Às vezes, usamos termos como ‘popular’ e ‘
arte contemporânea’ para classificarmos as coisas, mas a exposição traz uma reflexão maior sobre o que esses termos significam”.

Entre os trabalhos idealizados para a exposição estão performances, como a de Luiza Nóbrega, que, a partir de hoje, vai moldar um bloco de barro em torno de sua mão direita e esperará o material secar até a segunda-feira, como forma de mostrar a ação do tempo sobre a argila. Já Nadam Guerra elaborou uma história fictícia sobre uma
 entidade chamada Nossa Senhora do Alto do Moura, que apareceu no Apocalipse e teve doze filhos, que serão representados por figuras de barro. Já Deyson Gilbert vasculhou o depósito da fábrica e tirou dele objetos - entre eles uma espingarda gigante - para revisar os mitos simbólicos sobre os quais o Nordeste está assentado. 

Segundo o idealizador da mostra, Carlos Mélo, o primeiro embrião da bienal surgiu em 2006, a partir de uma vontade sua de fazer um projeto em artes visuais para Caruaru. “Nunca houve uma bienal do Barro no Brasil. Ao mesmo tempo, percebi a negligência com a qual as artes visuais foram tratadas e decidi trazer uma discussão estética sobre isso. A partir disso, surgiu a ideia de usar a Fábrica Caroá, para fazer um acerto de contas com a história e a memória da cidade. É muito importante que os espaços simbólicos de Caruaru sejam reativados e, para isso, é fundamental ter a participação da população. Só assim a bienal terá utilidade”.

NÚCLEO HISTÓRICO
Na segunda-feira (14), às 17h, será aberta a segunda parte da Bienal do Barro, chamada de Núcleo Histórico, com a exposição Verger e Vitalino, que enfoca o trabalho do Mestre Vitalino através das lentes do antropólogo francês Pierre Verger. São 21 imagens tiradas em 1947, trazendo o artesão em vários momentos, seja na feitura de suas obras, seja na feira de Caruaru, onde ele as vendia. As fotografias também mostram crianças manuseando o barro, em uma referência direta ao início da arte do próprio Vitalino. As imagens fazem parte do acervo da Fundação Pierre Verger, em Salvador, e a curadoria é de Carlos Mélo. O local também abrigará a instalação Loks, da artista alagoana radicada em Caruaru Presciliana Nobre, com garrafas feitas de argila, trazendo o nome de uma marca de cerveja escrita ao contrário. Tanto a exposição de fotos quanto a instalação acontecerão na Galeria de Artes Mestre Galdino, localizada no Sesc Caruaru.

MÁRCIO ALMEIDA
A instalação Honra ao mérito traz pedaços de tijolos unidos à estrutura da fábrica com fita crepe, funcionando como uma extensão da trama metálica presente no teto do espaço expositivo. A escolha do material remete à fragilidade da instalação, que pode se romper dependendo da tensão aplicada aos tijolos e às fitas. “Fiquei muito impressionado com a história da fábrica e também fiz uma ligação com a situação do Alto do Moura. O que mais me chamou a atenção foi a fragilidade dessa “honra ao mérito” em pertencer a uma fábrica ou a esse local tão conhecido em Caruaru. A situação das pessoas continua inspirando cuidados”.

JOSÉ PAULO
A manipulação do barro já faz parte da poética do artista, que traz, para a Bienal do Barro, dois volumes geométricos feitos de tijolos. Um desses retângulos que ocupam a Fábrica Caroá foi montado como uma espécie de fôrma, e a outra estrutura retangular mostra o produto desta “fôrma” de argila, “moldado” no formato de um quadrado. A precisão e a minúcia na disposição dos tijolos são características da obra. “A ideia do trabalho veio de visitas a olarias, que são encontradas tanto em Caruaru quanto em Bezerros. Pelas próprias características do material, tive de usar uma linguagem de construção para fazer a montagem”.

FÁBRICA CAROÁ
Localizada ao lado do Pátio de Eventos de Caruaru, a Fábrica Caroá, antigo ponto de referência da cidade, foi fundada em 1935 e desativada em 1978. O parque industrial extraía a fibra do caroá, uma planta, para fabricação de materiais como estopa, sisal e cortiça. “A primeira vez que Caruaru viu luz elétrica foi nas dependências da fábrica”, afirma Carlos Mélo, idealizador da Bienal do Barro, O local, com 4.800 metros quadrados, também abriga um museu, dedicado a resgatar o legado da fábrica, mas o espaço está, atualmente, de portas fechadas.


SERVIÇO
1ª Bienal do Barro
Núcleo Contemporâneo
Abertura: Sábado (12), às 17h
Quando: De 12 de abril a 19 de maio, das 10h às 17h
Onde: Fábrica Caroá - Praça Coronel José de Vasconcelos, 100, Caruaru

Núcleo Histórico
Abertura: Segunda (14), às 17h
Quando: De 14 de abril a 19 de maio, das 9h às 21h
Onde: Galeria de Artes Mestre Galdino (Sesc Caruaru)

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E conheça
 Os doze passos da Virgem do Alto do Moura, livro de Nadam Guerra:


http://issuu.com/nadamguerra/docs/virgem_livrowebb/1?e=0/7459445